17 de março de 2010

Santo Agostinho: um esquizofrênico?

Deus que me perdoe, mas eu aqui em meus estudos sobre dança volta e meia dou de cara com esse tal Santo Agostinho. Primeiro simpatizei com o cidadão, depois fiquei sabendo que era misógino. Agora encontro o seguinte trecho em uma tese:

Como nos lembra Garaudy (1980, p.28), usando as palavras de Santo Agostinho: “os padres da Igreja, Santo Agostinho entre eles, condenaram ‘esta loucura lasciva chamada dança, negóciodo diabo’”. (Pellegrin, 2007: 65)


Oras, foi esse o mesmo indivíduo que disse que sem a dança os anjos não nos reconheceriam, ou coisa parecida? (não vou reler a postagem abaixo porque o cara me deu preguiça, vamo combinar...).

Vai entender... Deve ser algum problema, vai ver o cara era esquizofrênico. Nada contra os esquizofrênicos, viu? Tenho bons amigos esquizofrênicos e com outras desordens similares... Mas é que o mesmo cara se posicionar de formas tão opostas em uma mesma vida (não que eu seja espírita cardecista ou essas coisas) é no mínimo esquizito!

16 de março de 2010

Por que o santo?

Não sou católica, espírita ou evangélica. Mas postei a oração abaixo porque me espantei de estar com 36 anos, 26 deles dedicados à dança, e nunca ter lido essa prece.

Enfim...

Santo Agostinho


Eu louvo a Dança

Eu louvo a dança, pois ela liberta o ser humano
do peso das coisas - une o solitário à comunidade.
Eu louvo a dança, que tudo pede e tudo promove:
saúde, mente clara e uma alma alada.

Dança é a transformação do espaço,
do tempo e do ser humano,
este constantemente em perigo
de fragmentar-se, tornando-se somente
cérebro, vontade ou sofrimento.

A dança, ao contrário, pede o homem inteiro,
ancorado no seu centro.
A dança pede o homem liberto,
vibrando em equilíbrio com todas as forças!

Eu louvo a dança!
Ser humano, aprenda a dançar!
Senão os anjos do céu não saberão
o que fazer de você.

12 de janeiro de 2010

O velho e bom Aiua!

Férias, início de ano novo, saudosismo... Estou nostálgica.
Encontrei a antiga página da web do meu velho e bom grupo Aiua! e me deu uma saudade imensa daqueles tempos!!!

Como gosto de ilustrar esse blog, resolvi contar umas historinhas daquele grupo.

Criei essa companhia de dança que passou a se chamar Aiua! Tribo de Dança em novembro de 1997. Estava com o saco estourando das coisas bizarras da área de dança do ventre e resolvi combater aquelas coisas feias, horrendas, ridículas, com uma boa dança. E funcionou por um bom tempo. Aiua! acabou em 2005. Transformou-se em outra coisa. Virou um método de dança. Mas penso que, assim como eu, Aiua! só está de férias. Porque revendo as fotos, pensei no imenso potencial que ainda resta a ser trabalhado.

Vejam só:


Uroboro - Serpente do Mundo

Uroboro faz parte do repertório da primeira formação do grupo. Temos um vídeo que um dia conseguirei colocar na web (ainda não disponho de conhecimentos suficientes para as conversões necessárias...). Éramos 14 integrantes: de dança, música, capoeira e teatro. Chegamos a trabalhar com artistas visuais, com projeções de slides, maquiagem corporal, confecções de figurinos especiais etc. Era 1998.

Tínhamos coreografias simples também, tenho fotos lindas daquele início... Dançando para milhares de pessoas na festa de encerramento do festival de cinema de Brasília em 1997, por exemplo. Vejam:



Vou fazer esse post pequeno, para desfrutar de outros posts sobre o Aiua! durante o ano que se inicia. É o ano do Tigre no horóscopo chinês. Sou tigre. Algo de bom deve sair dessa configuração. Quem sabe um Aiua! mais selvagem, mais tigrado, mais 2010 possa ser inaugurado, reinventado, renascido! Aiua! para todos nós.

5 de janeiro de 2010

Férias

Estou de férias!

Quem vive como eu quase nunca tira férias... Digo isso apesar de saber que algumas pessoas acreditam que vivo em férias permanentes por trabalhar com dança. Lembro de quando comecei a estudar na graduação: dança na universidade. Primeiro o espanto: existe isso? faculdade de dança?, depois o desdém: hum... deve ser muito gostoso, divertido, fácil etc... Costumava me irritar: fácil é o car%¨&*&%!!! gostoso é o cace#$%$#$*!!! Não interessa. É minha escolha e merecia ser respeitada. Hoje não tenho reação. Deve ser porque há tempos venho treinando não reagir à vida, mas agir.

Então, estar de férias é estranho porque meu trabalho costuma ser no mínimo extravagante. Vejam:
  • Eu não tenho um horário fixo para acordar e pode ser que algum trabalho vá até mais tarde ou comece muito cedo... Ou seja, rotina pra mim é não ter uma rotina de repetição;
  • Tenho muito tempo para pensar em mim. O trabalho com arte exige um certo ócio criativo e uma dedicação primorosa ao ser que cria. Preciso me tratar bem;
  • Não tenho um patrão. Trabalho para mim;
  • Posso estar em um local fechado, aberto, grande, pequeno, privado, público, na minha cidade, em outra cidade, no ambiente virtual, em qualquer lugar; e isso não é modo de dizer... é a minha realidade;
  • Costumo rir, chorar, extravasar a raiva, falar coisas sem sentido. Meus laboratórios criativos sempre são muito expressivos;
  • Leio muito;
  • Como diz o Osho, faço milagres: quando tenho sono durmo, quando tenho fome como (leiam o velho "guru" louco barbudo para entender essa);
  • Alongo meus músculos com freqüência;
  • Dedico certo tempo a atividades aeróbicas;
  • Dedico alguns momentos para ficar ao sol;
  • Dedico algumas noites para desfrutar do luar;
  • Tomo banhos de chuva.
Ora, não é para que me invejem que escrevo isso. Mesmo porque devo lembrar: não tenho FGTS, vale-transporte, 13° salário, auxílio-desemprego, ticket alimentação, plano de saúde institucional, previdência privada, nem férias! Por isso é espantoso que eu esteja de férias. Mesmo que tenha passado um fim de semana com R$7,50 no bolso. Estive pobre, feliz como nunca. Livre! Livre de que? De compromissos comigo mesma. Sim, porque o pior patrão é o nosso ego, sou perfeccionista. Não queiram imaginar como sou auto-exigente! Posso até sofrer auto-assédio-moral. Não, não sou esquizofrênica. Estou falando da realidade nada fácil e nada gostosa de ser empregada da dança, do amor à dança, da vida acadêmica, do eterno estudo, do eterno enfrentamento de si. Repito: não é fácil, não é gostoso. Mas não vou negar, é divertido!

Por isso não temos hoje um post sobre o tema desse blog. Apesar de isso ser uma contradição, já que tudo o que se refere a mim tem a ver com o tema deste blog, que é sobre a dança que eu quero. Contudo, vamos louvar minhas merecidas férias! Porque 2010 me reserva uma imensa e muito bem vinda carga de trabalho! Salam!

17 de novembro de 2009

O que é a dança do ventre?


Para começar: é dança do ventre ou Dança do Ventre? Dança do Ventre ou Dança Árabe? Dança Árabe ou Middle Eastern Dance? Middle Eastern Dance ou Raks el Sharki? Raks el Sharki ou Belly Dance? Belly Dance ou bellydance? Minha gente, isso importa?

As pessoas que estudam dança gostam de definições "toscas e bizarrescas" (para utilizar o título de um blog super interessante) para se apegar! Por sinal, a história da dança parece mais um agregado de almanaques de fofocas e outras informações que só interessam aos dançarinos que aparecem nelas. Muita gente de prestígio aponta que os críticos de dança foram os grandes responsáveis pelas compilações a respeito da dança ocidental. Eles e seus juízos e gostos. Porque se ficasse registrado que algo não era bom, ou que era maravilhoso, isso entrava para a história oficial.

Mas pra que estou me perdendo tanto? Para dizer que com a dança do ventre não é diferente. Aliás, pesquisar a dança do ventre é estar sempre à beira de uma armadilha. Eu caí em uma arapuca bem montada quando em 2005 saí divulgando que a "primeira" mulher a dançar a dança do ventre no mundo ocidental havia sido uma tal de Little Egypt. Me dei mal. A fonte de onde eu tirei a informação tinha citado outra fonte que citava a mesma fonte anterior. Estranho não? Uma metacitação? Tipo: eu combino com a Paula Cunha que a gente vai publicar que "não-sei-quemzinha" foi a primeira pessoa a dançar Khaleegee no Brasil. Aí eu coloco a Paula como minha fonte e ela me coloca como fonte dela. Foi tipo assim que aconteceu. Ainda bem que encontrei uma fulana disposta a desmentir essa história. Donna Carlton publicou um livro muito bem documentado, "Looking for Little Egypt". A conclusão: Little Egypt foi uma farsa bem montada!

Quando lancei a enquete "o que é dança do ventre", não imaginei que os resultados seriam aqueles. Ainda bem! Surpresa... 39% das pessoas afirmaram que a dança do ventre é uma dança árabe.

Ora, pessoal, e os outros? A Grécia, o Irã, a Turquia... A dança do ventre não é uma dança árabe, a cultura árabe faz parte dela, mas não a engloba. Ela vai além... Péeeeeinnn!!! Resposta errada!

32 % disseram que é uma dança sensual. Concordo! Bingo! É também.

As outras opções não foram muito expressivas, e algumas eram provocações.

Apenas 17% acertaram, respondendo a famosa NDA (nenhuma das anteriores). Por quê? Porque nenhuma das anteriores de fato consegue definir o que é a dança do ventre. Gosto da minha definição de que a dança do ventre é um "além", não se restringe a ser árabe, oriental, ocidental, sensual, porém é tudo isso e não é nada disso. Mesmo assim vale destacar algumas definições que considero bastante aceitáveis, principalmente do ponto de vista de quem define. A melhor de todas, para mim, é a de Anthony Shay:

Na prática, a dança solo improvisada, tanto para homens quanto para mulheres, é a forma primária de dança, com muitas variações individuais e locais, por todo o Egito. Essa forma de dança é talvez a mais mal interpretada tradição de dança no mundo. Em uma de suas numerosas formas é conhecida como dança do ventre, ou danse orientale ou raqs sharqi, como seu praticante preferir.

Adoro isso: "dança solo improvisada". Mas, novamente não basta. Estive recentemente em um palco. Experiência intensa, boa, excelente! Eu fiz uma dança solo quase improvisada, mas tinha ao redor um corpo de baile e diversas outras danças que compunham o espetáculo. Mais uma vez a dança do ventre vai além. Ela pode ser recriação de muitas coisas. Vi coisas lindas se materializando diante de mim: deusas egípcias da antiguidade representadas de inúmeras formas, mulheres lindas de todas as idades e tipos físicos se deleitando ao dançar, brincadeiras entre uma bailarina e um músico egípcio, que deixaram a platéia extasiada! Lindezas que só a dança do ventre é capaz de fazer. Viva o Ayuny (escola onde tenho dado aulas)! Viva Ankh (o espetáculo da escola)! Viva a dança!

E até a próxima enquete e o próximo post.

29 de outubro de 2009

O Silogismo é a Lógica do Extremista!


Uma amiga que está morando na Itália me enviou essa semana um email falando sobre "casamentos pedófilos do Hamas". O texto, mal escrito por sinal, continha explícitas referências preconceituosas em relação aos muçulmanos. Como dizia que a fonte da notícia era de um blog jornalístico, pensei: "Pôxa vida, esses jornalistas precisam de uma dose de antropologia para que se manifestem de um modo mais adequado". O artigo ainda vinha ilustrado com fotos e vídeos, mostrando noivas mirins com seus maridos na faixa dos 25 a 30 anos, crianças sofrendo abusos e relatos sobre o incentivo de tais práticas.

Fala sobre a mutilação genital e apresenta dados estatísticos sobre abusos contra crianças no Egito e na Jordânia, além de um suposto discurso do Aiatolá Khomeini. O tal discurso poderia ser comparado à tentativa de recriação de um trecho do kama sutra para pedófilos. Pesquisei na internet e encontrei o mesmo texto publicado na íntegra no blog "Salvação", cuja logomarca é uma cruz, que por alguma razão me fez lembrar da Ku Klux Klan. Procurei a fonte jornalística anunciada no blog, mas não encontrei. Até porque ando meio sem tempo. No site principal não havia um link disponível e pesquisar poderia demorar, se alguém quiser fazer isso, depois me manda o link, ok?

O que importa dizer aqui é aquilo que me fez parar de estudar para atualizar meu blog querido. As falas generalizantes que colocam TODOS os muçulmanos, TODOS os Árabes em um saco com o rótulo de "fanáticos religiosos", "terroristas" e agora "pedófilos" são pérfidas e apenas contribuem para que o senso comum fique recheado de preconceitos e sentimentos ruins, tendo a certeza de se tratar de verdade absoluta pois, ora bolas, está publicado e a fonte é jornalística! Para justificar tais idéias utilizam trechos de biografias deslocadas no tempo e no espaço. Justificaram a pedofilia, por exemplo, dizendo que Maomé se casou com uma menina de 6 anos. Esqueceram de dizer que isso aconteceu há mais de um milênio em um contexto cultural, social, político, geográfico e religioso completamente diferente do atual.

Pensei com meus botões que esse artigo fez algo horrendo e consegui alcançar uma analogia que me satisfez. O que o artigo sobre o Hamas faz, se compara a dizer que a pedofilia na Igreja Católica foi incentivada pela famosa frase de Jesus "deixai que venham a mim as criancinhas". Pode ser que eu seja atacada por algum fanático religioso após essa postagem, mas quem tiver o mínimo de inteligência saberá o que quero dizer com essa analogia. Mesmo assim, dou uma ajudinha para os menos favorecidos: podemos justificar qualquer coisa com qualquer argumento. É a famosa armadilha do silogismo: Maomé se casou com uma menina de 6 anos; casar-se com uma menina de 6 anos é pedofilia; logo: Maomé era pedófilo! E mais: Maomé é o pai da religiao islâmica, Maomé era pedófilo, logo: os muçulmanos são pedófilos.

Posso até ir mais longe. O que justifica os abusos contra crianças no Brasil? Alguma seita religiosa? NÃO! Por que existem casamentos de crianças na Índia? Porque eles são muçulmanos? NÃO! Por que um senhor de 112 anos se casou com uma adolescente de 17 na Somália? Será que a moça é gerontófila? NÃO! Por que alguns (muitos) pais fazem sexo com suas filhas? Porque gostariam de ser os Faraós do Egito? NÃO! Melhor parar por aqui...

Por fim, gostaria de anunciar que minha próxima postagem irá discutir os resultados da enquete que se encerrou há tempos sobre "o que é dança do ventre". Um assuntinho mais light! Até lá, queimemos nossos neurônios! Salam!